Literatura, opiniões, memórias, autobiografias, e demais diletantices.
Domingo, 31 de Agosto de 2014
O TEATRO JORDÃO VAI SER DESTRUÍDO?

Permito-me chamar a atenção para este texto acerca do futuro do Teatro Jordão, que é assunto que toca certamente aos vimaranenses e ninguém fala disto. Vem no "Comércio de Guimarães" desta semana.

 

Reflexões que Guimarães tece

Ontem, hoje e amanhã ...
Enfim, para mim, sempre!
A evidência de que a destruição da sala de espectáculos que é o Teatro Jordão é um crime de lesa vimaranensismo.
Sendo patente que não se trata, entre intermináveis outras que poderiam ser arroladas, nem da Ópera Garnier, nem da de Sidney (como Guimarães não é Paris, nem sequer aquela cidade australiana), a verdade é que, para a nossa dimensão e ambivalência cultural, a posse dum equipamento como aquele deveria lograr toda a atenção e carinho. Não porque não se pudesse fazer muito melhor; mas, simplesmente, porque está aí, construído e não desconsidera ninguém (não obstante os arranjos introduzidos pelo Gil de Azevedo, que, entre outras inovações despropositadas, lhe destruíram o bar original do balcão e descaracterizaram o respectivo foyer; ou as posteriores que modificaram as bilheteiras).
Aliás, o projecto do arquitecto Mário de Brito nunca chegou a ser integralmente concluído.
Em qualquer dos casos, sendo o estilo do edifício perfeitamente datável na sua modernidade, a fachada é dum enorme equilíbrio e o seu desenho apresenta uma harmonia que o emprego dos materiais nela utilizados (granitos, ferro e vidros), consentem realçar uma pureza de linhas que o fazem parecer leve e de boa concepção. É com efeito uma obra que não fica mal e, inclusivamente, marca uma precisa época. Digna, portanto, de ser olhada. Sem destoar sequer pela implantação; antes aberta e que a posterior ocupação que se deu ao arruamento no seu lado poente, em que as pouco satisfatórias fachadas aí levantadas, de certa maneira, mais valorizaram a daquela; ao mesmo tempo que se a promoveu a uma escala de rua que anteriormente não tinha. Sendo ainda de realçar o prolongamento do lavrado, que se encaixa com a frontaria da Auto Garagem Avenida (e antes das deteriorações neles provocadas, nos edifícios que se lhe seguem, até ao que foi um estúdio de fotografia, com uma varanda no sobrado rematada por uma secção de abóboda que cobria um busto sobre um pedestal que por lá morou), criando, assim, uma certa unidade temporal que, pela sua pouca expressão na cidade, talvez importe preservar.
Por outro lado, mas não menos despiciendo do meu ponto de vista, ainda que não de um técnico de indigitada fama, há que atentar na natureza da sua fábrica, com alçados em perpianho e atingindo, sobretudo na zona do palco, alturas superiores aos vinte metros. O que, marcando um período, requeria também uma certa perícia dessa arte que então ainda ocorria e que, actualmente, para projectos do género, caiu em desuso; até porque custariam rios de dinheiro, ou, como o outro papagueou, uma pipa de massa.
Por outro lado, também e ainda, estando o Teatro implantado em cerca de 1.500 metros quadrados, em quatro pisos sobrepostos, a sala de espectáculos propriamente dita só acontece nos dois últimos; o que, conjuntamente com os anexos, sem se a aniquilar, ainda permitiria disponibilizar uns 3.000 metros quadrados. A que, segundo reza, se juntarão os muitos mais que a Auto Garagem Avenida poderá acrescentar. Numa dimensão considerável que deve ser suficiente para, por muitos anos, albergar todos os mais ambiciosos voos artísticos da Escola de Arquitectura da UM (cujo edifício, em Azurém, não disporá de uma área muito maior àquele previsível total) e os de quaisquer outras agremiações musicais que lá se devam localizar. Lembrando que, sempre, muitas daquelas utilizações poderão servir-se da dita sala de espectáculos, se mantida e dos espaços que a circundam.
Ora, por tudo o atrás mencionado, por ainda por cima estarmos em tempos em que os dinheiros escasseiam e que, como todos sentimos na pele, devem ser parcimoniosamente gastos, não se percebe a racionalidade de umas obras de adaptação que passam pela destruição de um equipamento que, um pouco por todo este País de iletrados e onde quer que subsistiam dessas casas de espectáculos, elas estão a ser recuperadas; numa intenção apresentada como de preservação de memórias e, last but not least, como uma mais valia cultural. Até Vizela! Para já não falar do sempre termo de comparação que é Braga, de Fafe ou Felgueiras e sem ir mais longe. E não se diga, como tenho ouvido, que temos os auditórios do Centro Cultural de Vila Flor, ou o da Universidade, ou, até, o da Plataforma das Artes, porque são coisas diferentes. Quem não perceber isso não entende o percurso presente da cultura europeia de um nível, digamos e por favor, médio baixo. E como tanto se fala em elevar os nossos padrões culturais, em sermos realmente Europa (não em treta, mas no concreto de uma prática efectiva), é tempo de nos voltarmos para a qualidade de espectáculos que se impingem como mestrias que não são. Tenhamos, pois, plena consciência da mediocridade (para não dizer lixo conjuntural) que por aí grassa; e do caminho de penosa saída a que ela nos conduzirá. E volvamos a nossa atenção para um Teatro que muitas urbes ansiariam possuir.
Dito isto, que mais acrescentar?
Apenas que aquela septuagenária casa de espectáculos, por já estar, e ademais por isso mesmo, merece continuar. Carece, assim, de ser restaurada e recuperada em nome de uma cultura honestamente consistente, por devidamente alicerçada e, logo, de progressiva qualidade sustentada; o que, tarde ou mais cedo, acabará por se abater sobre este finisterrae europeu.
No que tenho esperança.

Óscar Jordão Pires
Fundevila, 21 de Agosto de 2014



publicado por Dito assim às 20:05
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Quinta-feira, 28 de Agosto de 2014
Aniversário de Goethe
http://youtu.be/WCBoz0ls57k
Hoje é dia de aniversário de Goethe,  que nasceu a 28 de Agosto de 1749.
Recordemo-lo, numa das mais belas canções de Hugo Wolf (1860-1903). A interpretação é de Elisabeth Schwarzkopf (1915-2006) acompanhada  magistralmente pelo grande pianista inglês Gerald Moore (1899-1987) no Festival de Salzburgo de 1958.
Conheces o país?  Habituei-me a este "Connais-tu le pays?" da ópera Mignon de Ambroise Thomas. Mignon é raptado e levado para a Alemanha. Evoca o seu país, a Itália.Dura 6 minutos. As imagens do video são um pouco pirosas. É o que encontrei. Esta interpretação é considerada modelar. Também não conheço melhor.
Uma tradução, das muitas que encontrei.

A canção de Mignon (Johann Wolfgang von Goethe)

 

 

Conheces tu a terra, onde os limoeiros florescem,
Onde no meio da escura folhagem as laranjas douradas brilham,
Do céu azul uma brisa suave sopra,
Onde silencioso o mirto e alto o loureiro ficam?
Conhece-la bem?
Aí! Aí
Eu gostaria de ir contigo, minha amada.

Conheces tu a casa? Sobre colunas assenta o seu telhado.
Brilha o salão, brilha o aposento,
Erguem-se figuras de mármore e olham para mim:
O que te fizeram, pobre criança?
Conhece-la bem?
Ai, aí
Eu gostaria de ir contigo, meu protector.

Conheces tu a montanha e o seu caminho perdido nas nuvens?
O mar procura na bruma o seu caminho;
Nas cavernas reside a velha geração dos dragões;
As rochas precipitam-se e sobre elas a corrente!
Conhece-la bem?
Aí! Aí
Fica o nosso caminho! Ó pai deixa-nos ir!

 



publicado por Dito assim às 19:57
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Terça-feira, 26 de Agosto de 2014
Não nos curamos da infância (Jean Ferrat, cançonetista francês)
Na rádio hoje a Sinfonia nº 3 de Brahms. Saudosismo. Uma tia minha a contar-me o filme "Aimez-vous Brahms?" de Anatole Litvak (1961), com Ingrid Bergman, Yves Montand et Anthony Perkins, segundo uma novela de 1959 de Françoise Sagan. Foi a primeira vez que ouvi Brahms.
Divida inesquecível a essa minha tia. Mas Brahms, a grande descoberta. Ainda era muito novo para ir ao cinema; jamais vi esse filme.
Reproduzir vídeo
Aimez vous Brahms? (Goodbye Again)


publicado por Dito assim às 20:09
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Ah, a ternura, digo eu.

 

 

Acho que o que cada um de nós tem a dizer ao mundo é aquilo que é, e não aquilo que as pessoas devem ser. Há em ti qualquer música que não se deixa agarrar, e talvez tu mesmo deixes escoar nas mãos. Há pelo menos uma ternura profunda, de que eu sou ou fui não só testemunha  mas também  objecto. Deves procurar em ti mesmo – que ainda é o melhor livro que podes ler.

Esta carta caótica foi inspirada pela necessidade de comunicação contigo. Pressinto que atravessas uma crise. Mas o sofrimento nas pessoas que não são inertes  pode ser uma auto-revelação e mudar as nossas relações com as pessoas e com o mundo. Mas aqui começo eu a ser didáctico!

 

(Carta de António José Saraiva exilado em Amesterdão para o seu amigo Óscar Lopes em Leça da Palmeira, primeiros meses de 1971)

 



publicado por Dito assim às 19:09
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Domingo, 24 de Agosto de 2014
Outra vez José Cutileiro

Admirador deste ex-embaixador de Portugal, irmão do escultor, autor dos "Bilhetes de Colares", crónicas deliciosas escritas com o pseudónimo de A.B.Kotter (1982-1998) e compiladas em livro em 2007 pela Assírio e Alvim, continuo a segui-lo no blogue de Vera Futscher "Retrovisor".

Já em 2004 havia saído uma compilação das de 1993 a 1998.

O Portugal contemporâneo (fin-de-siécle) na escrita irónica e elitista do cidadão britânico Alfred Barnaby Kotter, aliás José Cutileiro (Pedro Mexia dixit).

Livros esgotadissimos.

 

Mais uma:

 

13.8.14

 

 

 

 Paula Rego - A dança

 

 

 

 

 

Quem sabe, sabe.

 

 

Entre as duas guerras (a de 1914-1918 e a de 1939-1945, lembro às leitoras mais novas), a propósito da explosão de exibicionismos que borbulhavam nas années folles, André Gide (francês e Prémio Nobel da literatura em 1947, lembro às leitoras menos dadas a leituras) dizia ver à sua volta mais artistas do que obras de arte. Nessa altura não havia nem internet nem twitter nem facebook nem blogs e, com o que hoje se chamam plataformas a coisa mais parecida seria o cinema, que Meliès e os manos Lumière tinham solto em Paris e vingara na Europa e nos Estados Unidos como a prole de um casal de coelhos na Austrália — mas hedonismo, egotismo e narcisismo são antigos e para lhes dar asas cada uma sempre usou o que tivesse à volta (ensimesmada: quando perguntaram às águas do lago se Narciso era mesmo belo, estas responderam que não sabiam porque quando ele vinha olhar-se nelas, elas aproveitavam para se olharem a si próprias nos olhos dele — ou, pelo menos, foi o que Oscar Wilde contou, não sei se antes se depois de ter conhecido Gide em Paris, onde viria a morrer. O mundo é pequeno).

 

De artistas e de obras de arte pouco ou nada sei mas há mais de dez anos virei comentador e, de silêncios aconchegados, longe da balbúrdia pátria, vou mandando bocas. Agora, chegado no começo do mês de Bruxelas, lendo os jornais e olhando para o que Conchita Cintrón chamava la pantalla chiquitita, suspeito que neste maravilhoso país que tão generosamente acolhia Freddy Kotter no seu seio a algazarra dos comentadores cobre de uma espécie de smog as coisas a comentar. Não é que estas faltem — desde o esforço vão do governo para transformar os portugueses em alemães (por via fiscal, ainda por cima) com Herr Gaspar, primeiro, e Frau Albuquerque, depois, a encaminharem-nos com um vasculho, como dantes os vendedores de perus pelas ruas de Lisboa, até à sanha súbita contra várias gerações da família Espírito Santo, reminiscente do azar dos Távoras — mas, bombardeadas pela cacofonia pátria, essas coisas e outras de menor porte deformam-se como as nossas caras na galeria de espelhos de uma feira de diversões.

 

Disse à Vera, dona do blog, que estava a pensar deixar de escrever o Bloco-Notas mas ela disse-me que eu não podia fazê-lo e que o mundo agora era assim, que todos podiam deitar palavra e que havia leitoras para tudo quanto se escrevesse. É, com efeito, um pouco tarde para protestar contra o ensino obrigatório, contra enciclopédias que anunciam à cabeça não garantirem que a informação que nos dão seja verdadeira e contra o ulular desafinado dos comentários de nós todos. Mas eu sou um pequeno-burguês de Évora e às vezes sinto-me como patrício meu, sentado sobre tábuas pousadas em tripés na primeira fila de um circo de província. A gaiola dos leões desconjuntou-se, o público saltou para fugir, e o meu patrício com as partes pudendas entaladas entre duas tábuas, sem se poder levantar, gritou: “Sentem-se, caralho, que os leanitos nã fazem mal”! 



publicado por Dito assim às 19:30
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Domingo, 3 de Agosto de 2014
UM TOQUE DE MELANCOLIA?

A seriedade da vida

 

Em Komorn, [Hungria]  um  outro letreiro bilingue informa que em certa casa nasceu Franz Lehár, mestre de um ilusionismo elevado ao quadrado e de uma música de consumo na qual a nostalgia das valsas de Strauss se corrompe, apesar da mestria aprazível, em vulgaridade desenvolta. O ilusionismo da opereta, que resume a vida no mote “criado, champagne!”, não oculta porém que tudo se trata de uma ficção brilhante, de uma máscara e de uma simulação de brio. A sua indústria do cinismo galante e sentimental é uma figura de papelão que, sem se dar ares de importância, distrai da seriedade da vida.

(De Danúbio, livro de Claude Magris, um grande escritor italiano).

 

Neste texto poderíamos substituir Lehár e Strauss e a música por autores de livros ou de músicas. Esta definiçao sobre o consumo, a mestria, a vulgaridade, a ficção brilhante, a figura de papelão, como se poderiam aplicar a  epífenómenos  ou a manifestações inorgânicas de hoje!

Ah, grande Claudio Magris!



publicado por Dito assim às 20:26
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